Não é só morador de cobertura: alta de impostos afeta a todos, dizem economistas
Especialistas explicam por que medidas têm impacto direto sobre crédito imobiliário, agronegócio e investimentos, encarecendo produtos e serviços

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, defendeu nesta quinta-feira, 12, as medidas de ajuste fiscal contidas na Medida Provisória (MP) publicada pelo governo na noite de quarta-feira, 11, desafiando defensores de bancos a se manifestarem publicamente. O ministro usa o argumento de que as medidas de aumento de impostos não afetam o dia a dia da população, atingindo principalmente “moradores de cobertura”.
Economistas consultados por VEJA contestam a visão do ministro e destacam que a MP impacta diretamente o cidadão comum e o setor produtivo. Os especialistas também concordam que o governo precisa também reduzir despesas, e não apenas buscar aumentar a arrecadação tributária.
Pablo Alencar, sócio da Valor Capital, diz que a frase de Haddad sobre defensores de bancos pode servir como “manchete”, mas está desconectada da realidade. Para ele, a MP atinge investidores individuais, empresas e setores estratégicos como agronegócio e infraestrutura. “Essa retórica de defensores do banco pode funcionar em palanque, mas ignora que o verdadeiro impacto recai sobre milhões de brasileiros que investem, empreendem e financiam o crescimento do Brasil”, disse Alencar.
Segundo Paulo Henrique Duarte, economista da Valor Investimentos e mestre em finanças pelo MIT Sloan, o governo está focado apenas em aumentar a arrecadação sem discutir seriamente a redução de gastos. Duarte afirma que o discurso de justiça fiscal do ministro “funciona até certo ponto” e está mais próximo de uma estratégia de marketing. “O que o ministro Haddad tem tentado construir é um equilíbrio fiscal só na frente de receita”, afirma. Ele acrescenta ainda que as mudanças tributárias sobre instrumentos financeiros essenciais ao agronegócio e ao setor imobiliário, como as LCAs e os CRIs, “devem agravar problemas de financiamento no médio e longo prazo.”
Denis Medina, economista e professor da Faculdade do Comércio, foi mais enfático ao criticar o ministro. Segundo ele, Haddad está “mentindo para a população” ao dizer que apenas bancos e moradores de cobertura seriam afetados pela medida. Medina explica que instrumentos como LCI e LCA são fundamentais para o financiamento imobiliário e do agronegócio, e o aumento da tributação eleva o custo do crédito em toda a economia. “É uma cortina de fumaça. A verdade é que os moradores de cobertura não pagam a conta sozinho, eles ream para seus clientes”, afirmou. Medina ainda ressaltou que o aumento de impostos gera um efeito cascata, encarecendo produtos e serviços consumidos por todos.
Jorge Ferreira dos Santos, economista e professor da ESPM, destacou que a tributação sobre investimentos, como o J (Juros sobre Capital Próprio), que subirá de 15% para 20%, pode comprometer a atratividade dos investimentos produtivos. “O governo tenta preservar o consumo das famílias e o crédito bancário, mas ao custo de desestimular a poupança e os investimentos de longo prazo. Isso afeta diretamente setores como o imobiliário e o agronegócio”, explicou Santos.
Caminho mais fácil
Guilherme Almeida, head de Renda Fixa da Suno Research diz que o governo opta por caminho mais fácil, que é o aumento da receita via aumento de impostos . “O governo acaba perdendo mais uma oportunidades das diversas já perdidas de atacar problemas estruturais e melhorar a eficiência dos gastos públicos. É difícil discutir cortes porque 90% do orçamento é engessado está destinado a gastos obrigatórios , mas a eficiência pode ser discutida”.
A uniformização das alíquotas de imposto para aplicações financeiras pode ser tecnicamente positiva economicamente promovendo a isonomia tributária. Do ponto de vista financeiro, o desenho das medidas tira o estímulo a investimentos de longo prazo. “O investidor não tem o benefício que teria caso mantivesse o investimento com prazo mais prolongado”, diz, dizendo que isso também afeta a negociação de ações também.
Ao tributar títulos isentos ele também aponta que haverá o aumento no custo de captação, tornando o crédito mais caro para setores imobiliário e do agronegócio . O custo de emitir LCI vai se tornar mais alto o que pode prejudicar crédito para imóveis no médio prazo. No fim do dia o crédito imobiliário terá um impacto de majoração. O mesmo acontece com os produtos voltados ao financiamento do agronegócio como as LCA e CRA. “Impacto negativo do ponto de vista financeiro”.